segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Uganda: Pérola de África (Parte 1)

A chegada a Kampala, capital do Uganda, foi diferente de todas as outras por motivos vários.
Tinha sido um dia cheio de tensão vindo do Quénia uma vez que pensava ter o amortecedor traseiro partido o que me fazia andar mais devagar do que é habitual. Abrandava em todas as lombas, grandes e pequenos buracos, tendo de conduzir ainda mais atento do que o habitual. O facto do GPS ter deixado de funcionar, impedindo-me de traçar rotas também ajudou ao dia se ter tornado mais cansativo.

Cheguei assim a Kampala já o sol tinha desaparecido há muito e a busca pelo hotel, agora sem a ajuda do GPS, teve de ser feita com o pequeno mapa do guia Lonely Planet e com a informação que algumas pessoas me iam dando (não recomendável em África dada a ausência quase total de noção de distância/orientação da população em geral).
Cansado e tenso encontrei o hotel que procurava depois de quase duas horas à procura.
Não foi a melhor forma de entrar em Kampala e de chegar ao Uganda.
O primeiro impacto com o Back-packer escolhido também não foi o mais agradável.
Vinha do norte do Quénia, do deserto, da paz que nele se encontra e dava por mim numa cidade agitada como Kampala, num local cheio de turistas e barulhentos.
Ali, ao contrário de Loyangalani havia pizza, Internet e...ruído. Queria sair dali mas acima de tudo queria descansar; fiquei.


 
Ainda pelas estradas do Quénia rumo a Kampala no Uganda 


Winston Churchill apelidou o Uganda como a "Pérola de África" e sabia do que falava.
Uganda é dos países deste continente onde mais se sente "África". País com a mais alta cordilheira de montanhas em África, as Rwenzori, país onde nasce o maior rio do Mundo, o Nilo, com o maior lago do continente, o Lago Victoria, e país no mundo mais densamente povoado de primatas, entre outros factos.
Uganda é um dos países cujo cenário mais se enquadra na ideia romântica que muitas pessoas fazem de África: estradas em terra-vermelha, vegetação luxuriante de um verde difícil de acreditar, um povo simpático e humilde e parques naturais cheios de vida animal diversa. Tudo isto misturado com miséria, sofrimento e crueldade.

O reinado de terror vem desde os anos setenta, primeiro com Obote que se exilou em Dar Es Salaam, depois do golpe de estado do seu ministro da defesa Idi Amin´s ("Big Daddy". A ver ou rever um filme excelente baseado no Uganda daquele tempo e em Amin que é "The Last King of Scotland") e a sua perseguição política.  Toda a classe intelectual do país foi perseguida e assassinada, os estrangeiros expulsos do país, a economia colapsou, as infraestruturas arruinaram-se, a inflação bateu os 1000% e centenas de milhares de pessoas fugiram para países vizinhos.
Nessa altura, em finais dos anos 70, um dos poucos apoiantes e financiadores do governo do Uganda era o Coronel Gaddafi que "ajudava" este  governo corrupto em nome da "fraternidade Islâmica" (Amin nessa altura, muito convenientemente, já se tinha convertido ao Islão).

Depois de se ter voltado para o país vizinho, Tanzânia, e iniciado uma guerra sem qualquer motivo (a razão era que considerava que a Tanzânia albergava opositores ao seu governo), refugiou-se na Arábia Saudita onde viria a morrer em 2003, sem que justiça tenha sido feita.
Deixou o país de rastos.

Tudo virou caos e o Uganda, sem governo, ficou entregue a gangs de bandidos, fortemente armados que destroçou o país com pilhagem e morte; deixou de haver comida, medicamentos e os refugiados começavam a regressar sem que o país tivesse condições para os receber.

Obote regressou do seu exílio e tomou o poder, uma vez mais, com o apoio da Tanzânia, e manteve no país o curso de destruição que Amin havia tomado, desta vez favorecendo a sua tribo.
Os jornalistas ocidentais foram expulsos e as diferentes tribos da de Obote foram perseguidas e mortas.

Em 1985 novo golpe de estado pelos militares chefiados por Tito Okello.

Okello não era o único oponente de Obote e depois de este se ter tornado presidente pela segunda vez uma guerrilha tinha começado a ser formada no Oeste do Uganda liderado por Museveni (actual presidente do Uganda) de nome Nacional Resistence Army (NRA).
O NRA acabou por tomar o poder atirando com as tropas de Okello para o norte, até ao Sudão.

O pesadelo parecia ter terminado para o povo do Uganda.
Nos anos que se seguiram acordos de paz foram feitos, quase meio milhão de refugiados regressou ao Uganda, os serviços básicos foram restaurados, aumentou a produtividade do país, a agricultura cresceu, as estradas foram recuperadas e as infraestruturas restauradas.

Por mais de uma década o Uganda foi a economia que mais cresceu em África atraindo investidores estrangeiros como nunca tinha acontecido até então.

Porém, o terror voltou ao Uganda.
O grupo armado Lord´s Resistence Army (LRA), fundado no tempo do NRA e o seu líder Joseph Kony foram os responsáveis.
Kony, um homem com fortes perturbações mentais, passou de atacar soldados do NRA a civis indefesos, mulheres e crianças, na sua bizarra tentativa de fundar um novo governo baseado nos Dez Mandamentos da Bíblia.
As suas tácticas incluem tortura, mutilação, violações e rapto de crianças para formar o seu exercito pessoal.
Mais de um milhão de pessoas do Nordeste do país fugiu para campos internos e ainda hoje, em 2011, milhares de crianças saem de suas casas todos os dias durante a noite e fazem largos quilómetros para dormirem em zonas mais seguras, como escolas e igrejas.


Documentário: Uganda´s Silent War


Por seu lado o exército do governo também cometeu atrocidades, na sua luta contra a guerrilha, fazendo ainda mais vítimas entre o povo sofredor do Uganda.

Museveni, que  está no poder desde o final dos anos 80 acabou há uns dias de ganhar as eleições para mais mandato (depois de há uns anos ter alterado a constituição do país para manter o cargo de Presidente do Uganda) e o país, apesar da elevada corrupção e marcadas divisões étnicas está relativamente calmo e seguro.

Este rápido resumo da história política do Uganda desde a sua independência, ajuda a melhor entender o estado do país e do que o seu povo passou.
A mim ajuda-me a relativizar acerca de assuntos que considero fundamentais na minha vida e a reflectir sobre coisas que considero triviais e adquiridas no meu país, tais como Paz, Democracia, Liberdade e Direitos Humanos.

Apesar de todos estes anos de terror os Ugandeses pareceram-me um povo positivo e alegre, humildes e educados.

De volta a Kampala, conhecida como a cidade das sete colinas, tal como Roma.
O que mais me chamou a atenção foi a quantidade incrível de motos táxis que circulam na capital. Milhares de boda-bodas transportam pessoas (por vezes mais de 4 em cada um),mercadorias e animais.
Mercados, pequenos comércios, templos hindus, restaurantes de comida local, hotéis mexurucas e parques de táxis gigantescos enchem a cidade, tornando-a em alguns pontos caótica.
Existem porém locais mais calmos, onde até se pode passear calmamente.

Ao contrário de Nairobi é uma cidade que considero agradável e segura.

Como disse antes fiquei num back-packer a poucos quilómetros do centro. É um local calmo (quando os autocarros de turistas partiam) e aproveitei, assim, para recuperar a Miss AN da pancada que levou pelas estradas do Turkana.

Com a companhia da Dona Porca e de alguns macacos das redondezas li, escrevi, organizei algumas fotografias e descansei (confesso que também comi alguns hambúrgueres, bebi umas cervejas, bebi bom café e naveguei na Internet). Também acompanhei ali tudo o que ia acontecendo no Egipto. Sorte a de ir para Sul, não?!




Algumas das mazelas suaves da Miss AN




A Dona Porca e uma família de macacos fazendo-me companhia 










Passeio por alguns dos "agitados" mercados de Kampala

"Arley Dividson" made in China. Onde mais podia ser?!




Pormenores nas ruas da cidade: tudo se vende, tudo se anuncia

 
As últimas novidades de filmes e séries por 40 cêntimos numa loja ali bem perto. Quem pode resistir?!


Eleições no Uganda. Adivinhem quem ganhou com maioria?

Nile é especial. Cerveja Local.

Cenário típico de rua em Kampala (e por tantas cidades de África)


Ao fim de uns dias, ainda baseado na capital, fui visitar a cidade de Jinja.
Já tinha passado por lá a caminho de Kampala mas a pressa de chegar e o cansaço não me deram vontade de parar e queria dedicar mais tempo para conhecer a famosa nascente do Rio Nilo.
O local, nas margens do Lago Victoria, é famoso por esse facto e tanta coisa se escreveu em torno da busca da nascente do Rio Nilo.
Estivemos lá e gostámos ambos do que vimos. Ali começa o Nilo.




Aqui começa o maior rio do Mundo: Nilo




Welcome to Uganda: Onde tudo cabe e há sempre espaço para mais um


Mesmo sem GPS para traçar rotas fui sempre encontrando maneiras agradáveis para o fazer

Depois de uns dias de descanso seguimos para Oeste através de lindas estradas de cenários  verdejantes, passando por aldeias inteiras espantadas ao ver-nos passar. 

1 comentário:

  1. Olá boa dia.
    Gostava muito de entrar em contacto consigo.
    Vou para Uganda para a semana e gostava de lhe perguntar umas coisitas ;)
    O meu email é dicajo@sapo.pt
    Cumprimentos.
    Diana

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