quarta-feira, 27 de abril de 2011

O Zimbábue e o Sr. Mugabé


Que sensação incrível a de partir de novo, com a Miss "limpa e enxuta" e a rolar numa bela estrada rumo a um novo país.
Os cerca de 150 quilómetros que separam Tete da fronteira com o Zimbábue, perto de Dzunga, foram feitos com enorme prazer depois de ter sido obrigado a estar parado durante mais de duas semanas no mesmo sítio a trabalhar na mecânica da mota.
Despedi-me, uma vez mais, de Moçambique e entrava agora num novo país, um país complicado, para dizer no mínimo.
 
Muitos foram os viajantes que fui encontrando ao longo da viagem que me disseram que não incluíam o Zimbábue nas suas rotas.
Alguém me disse que nunca iria passar num país governado por pessoas tão corruptas como o Sr. Mugabé e seus companheiros. Lembro-me de estar com essa pessoa a beber um café numa esplanada no sul do Uganda e ter-me rido daquele infeliz comentário, argumentando que o Uganda não é, certamente um modelo de país democrático com lideres de confiança. Esse jovem, sueco que viajava naquela zona de mochila-às-costas,  disse-me ainda que mesmo que quisesse não poderia entrar no Zimbábue pois o governo sueco  o desaconselha e deste modo não iria contra essa indicação. Outro motivo que deu para não visitar o país foi  o facto do seu seguro de viagem não cobrir aquele país.
Lembro-me do meu ar estupefacto quando ouvi tais argumentos e de pensar nas diferenças de culturas entre latinos e nórdicos. "Mas não podes como?! Seguro?! Tens algum seguro de viagem? Pois, nunca pensei nisso... O teu governo não te deixa???!!".
Pois, o meu governo deve ter certamente mais com o que se preocupar do que fazer tais recomendações...

Bom, o certo é que aquele jovem sueco e muitas outras pessoas com a mesma opinião e receios não virão ao Zimbábue durante os próximos anos uma vez que não se vislumbram melhorias na democracia daquele país. É uma pena para a população pois o turismo, apesar de  quase inexistente  é uma fonte de receita para os zimbabweanos, castigados há muito pelas politicas desastrosas dos seus governantes.

E assim, sem qualquer receio, entrei naquele pais sem qualquer dificuldade, tirando o visto necessário na fronteira com pouco movimento, dirigindo-me para Harare, a capital do Zimbábue.
As estradas naquele pais estão em boas condições e as infraestruturas funcionam. Existem postos de combustível (com gasolina, ao contrário de alguns países vizinhos) ao longo da estrada e algumas lojas vendem comida nas aldeias e pequenas cidades. Tudo parece "normal".

Depois de alguns quilómetros dentro do país a Miss provocou-me um novo susto: depois de se engasgar por diversas vezes parou completamente e assim ficou. Estava numa estrada de asfalto muito pouco movimentada e, ainda "traumatizado" com os acontecimentos do Malawi, receei que tudo aquilo se repeti-se. Teria mais uma vez de colocar a Miss em cima de um camião até Harare?! Estava cansado de avarias e desejei com todas as forças que tudo corresse bem.
Pensei que talvez houvesse um problema com a gasolina que tinha colocado há pouco tempo e consegui fazer mais uns quilómetros até à próxima estação de serviço, drenando completamente o depósito e substituído a gasolina.

E tudo pareceu voltar de novo à normalidade. Arranquei novamente, satisfeito, e cheguei a Harare umas horas depois, debaixo de chuva.


O Zimbábue, anteriormente designado por Rodésia do Sul e depois simplesmente Rodésia, apresenta a maior taxa de inflação do planeta.
É um exemplo de um país cuja política de governação foi e continua a ser ruinosa, sendo os habitantes a pagar a pesada factura acumulada pela demência do seu líder, Mugabé e dos seus colegas de governo.

Este é um país marcado pela hiper-inflação da sua economia nos últimos anos: em Fevereiro de 2007 foi registada uma inflação de cerca de 1800%, subindo para 4500% em Junho e 100.000% no final desse ano. No ano seguinte a inflação chegou ao incrível número de 9.000.000% ao ano e em 2009, aos exorbitantes níveis de 98% por dia.
As ruinosas políticas do governo têm vindo a destruir a economia deste país, arrasando com o sector produtivo e agrícola.
Nos últimos anos, o Zimbábue tem diminuído drasticamente a sua produção agrícola no seguimento de politicas de apropriação de terras. O Sr. Mugabé jogou aqui a cartada da raça, expropriando as terras dos brancos do Zimbábue, os maiores produtores do país, oferecendo-as a governantes e simpatizantes do partido.
Previsivelmente os novos proprietários, depois de enriquecerem com o produto roubado, deixaram a produção cair por falta de competência e investimento, ficando a maior parte dessas terras ao abandono.
 
Nos dias de hoje, o país depende quase exclusivamente da importação de alimentos e da ajuda internacional. 
Deste modo, a economia do Zimbábue, que já foi um dos países mais prósperos de África (conhecido por o "Celeiro de África") encontra-se, desde 2000, numa profunda crise.
 O índice de desemprego é a maior do mundo com 88% e no último relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para 2010, mostra o Zimbábue na posição 169, o último país do ranking.






Ruas de Harare, um misto de edifícios coloniais e modernas torres de escritórios com ruas cheias de pessoas tristes, sem esperança num futuro melhor com o seu presidente


O que mais me surpreendeu na cidade foi o preço elevadíssimo de todos os bens de consumo, o preço da gasolina e dos hotéis. Custa-me imaginar como viverão as pessoas o seu dia-a-dia com estes preços.

Tendo um budget limitado, não consegui ficar num hotel em Harare e tive de procurar um pouco mais, encontrando por fim uma pensão mais "barata", onde por 40 USD passei a noite.

No dia seguinte passei a manhã a deambular pela cidade e a descobrir as ruas do seu centro: uma mistura de edifícios coloniais, de arquitectura britânica e torres de escritórios espelhadas.


Robert Mugabé merece um sinal de "Give Way"  para este país poder de novo crescer


O dia estava cinzento e eu não quis ficar mais na cidade. Rumei então a norte em direcção ao Lago Kariba, que faz fronteira com a Zâmbia, mais a Norte.

O Lago Kariba é o maior lago artificial do mundo e está sobre o rio Zambeze, cerca de mil e trezentos quilómetros a montante da sua foz em Moçambique. Este lago "nasceu" em 1959 com a construção da barragem de Kariba e faz de fronteira natural com a Zâmbia naquela região.

Os poucos locais onde é possível ficar junto ao lago estão quase todos do lado do Zimbábue e assim aproveitei para uns momentos de descontracção nas suas margens.
Encontrei um local com vista para o lago, montei a tenda e passei a noite junto das suas margens, uma zona calma e sem mais ninguém em redor.







 Margens do Lago Kariba. Aproveitei para montar a tenda e relaxar longe de tudo.


Estava perto da fronteira com a Zâmbia e no dia seguinte rumei para Lusaka, a sua capital.
Passei a barragem de Kariba e estava num novo país, a Zâmbia.




Perto da fronteira com a Zâmbia:
rectas a perder de vista e curiosos encontros na beira da estrada


A minha curta estadia no Zimbábue não se deveu ao estado politico daquele pais nem tão pouco a nenhuma questão relacionada com a minha segurança.
Na verdade sentia necessidade de rolar, de fazer quilómetros. Sentia-me bem por estar de novo na estrada e queria avançar.
Ainda tinha (e continuo a ter) muitos quilómetros para fazer até completar o meu objectivo: chegar a Queluz, Portugal, acompanhado da Miss Africa (e de preferência que não seja em cima de um camião).


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